domingo, 6 de setembro de 2009

na ponta dos meus dedos te sacio
dum gozo que percorre a tua pele
espesso e perfumado como mel
quente como a lava de um rio.

na ponta dos meus dedos te confio
palavras que a boca mentiria
amar é mais um acto de magia
que o sexo só tornou num desafio.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

não é o teu olhar que mais recordo
nem são as tuas formas que relembro
são as tardes mornas de setembro
que sinto ainda longe quando acordo.

do corpo que me deste nada tenho
perdi todos os elos do encanto
amei-te, sim, amei, mas entretanto
esbateu-se a tua luz no meu desenho.

agora que partiste pinto à tarde
com pinceladas tristes e singelas
e vou compondo a cor nas minhas telas
com cinzas dum amor que já não arde.

setembro foi o tempo das quimeras
das vinhas e dos vinhos perfumados
dos sonhos e dos beijos destinados
ao sobrevir de novas primaveras.

domingo, 30 de agosto de 2009

um mar azul turquesa que reflecte
um barco de alva vela pela espuma,
um sol incandescente que se apruma
num céu apolescente que derrete.

um livro de poemas que promete
deixar-me na toalha a tarde inteira,
um grito de gaivota passageira
que voa pela praia e compromete.

nas ondas, enredada, qual sereia
tentando equilibrar-se com firmeza
escorada no seu traje de beleza
uma morena linda titubeia.

bela não fosse e a turba zombeteira
que se compraz na ignóbil estultícia
faria do seu escárnio uma notícia
e da nudez da ninfa a sua esteira.
de ti não quero juras nem promessas
de ti não quero choros nem tristeza
de ti não quero cartas sobre a mesa
dizendo que partis ou que regressas.

de ti não quero nada que me amarre
de ti não quero esperança ou ilusões
de ti apenas quero as sensações
que o tempo em si desfaz e depois varre.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

eu quero ser a chama e ser o sopro
o ânimo fulgente que te anima
a brisa passageira que te mima
um corpo torneado pelo escopro.

eu quero ser o mestre e ser o servo
num lúbrico xadrês de sedução
sacrifricar meu rei ao teu peão
com quanta força d'alma em mim reservo.

eu quero que o meu beijo te provoque
num fogo incendiário de conquista
um frémito pulsante que resista
à força intempestiva doutro toque.

domingo, 23 de agosto de 2009

Ir pelas praias à boleia do vento
Colher pelos campos a seara a espigar
Viver de sonhos, do livre pensamento
Escrever poemas como doce entretimento
E ser feliz por respirar.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

se se morre de amor quero que morra
que o ar dos seus pulmões se petrifique
que o sangue nas artérias já não corra
e num sorriso exangue o rosto fique.

se se morre de amor quero que sinta
o álgido calor que me percorre
enquanto no meu corpo o sangue morre
a palidez funérea o rosto pinta.

se se morre de amor morramos juntos
nos braços um do outro como amantes
e desçamos à terra triunfantes
arautos do amor quando defuntos.
é pequeno,
talvez da medida exacta.
dói quando se maltrata,
cabe na palma da mão.

pulsa, contrai e se distende,
tem razões que ninguém entende.
assim é o coração!

da chegada do amor (para a Codinome beija-flor)

chegou no silêncio de uma manhã de prata
vestido de névoa e trajando um aguaceiro
chegou pela hora em que a solidão nos mata
fruto da aljava do imbele arqueiro.

entrou pela pele e provocou no pulso
torrentes de suor e erupções de medo
e a cada espasmo a cada novo impulso
cresceu e vigorou como um segredo.

agora já maduro tem brônzea armadura
resiste às intempéries no meu coração
quixotesco amante que a dor depura
hercúleo adamastor contra a solidão.
Passa lesta
Pela fresta
Da janela entreaberta

E se a noite se refresca
O seu corpo é a aresta
Onde parto à descoberta.
Amor,
Não sei bem por que to chamo
Na verdade eu não te amo
Nem sequer amei alguém.

Meu bem,
Eu não tenho o teu retrato
Nem reparo no teu fato
Nem pergunto se estás triste.

Desiste,
Eu não sou quem tu procuras
Nos recortes das gravuras
Das revistas que me lês.

Vês,
Tudo em mim é uma farsa
E se o amor fosse comparsa
Mentiríamos os três.

sábado, 15 de agosto de 2009

sou o que nasceu
das cinzas onde morreu
o último dos numes
que pereceu ante os lumes
da inquisição

sou filho do mar e da terra
e para a pátria que me desterra
sou pária sem coração.
O teu sorriso mata
O teu sorriso fere
O teu sorriso exalta
A tristeza que confere.

O teu sorriso grita
O teu sorriso chora
O teu sorriso mora
Nos teus lábios de mulher.
Morrem os poetas como as violetas
Mas se fossem gatos
Também morreriam?

Pobres dos poetas que usam as canetas
Para escrever com letras
O amor que os gatos miam.
Um pouco mais de luz o dia finda
O sol apressa o passo para o escuro
Um pouco mais de luz, quem sabe ainda
Os segredos que nos guarda o chão maduro

Um pouco mais de luz, para lá do muro
Ouço correr crianças como eu também corri
Um pouco mais de luz, envelheci
E morro sem saber o que procuro!
Tocam de Bach uma cantata
No ar evola-se o cheiro a pão
É certamente alguém que a saudade mata
Num coração que se maltrata de paixão

Se assim não fosse por que estaria
Tocando a estas horas esquecidas do dia
Com tanto empenho, tanta emoção?

Quem assim toca morre de amor
Entre incontáveis soluços de pranto
E assim desfia clavicórdios de dor
Nas góticas estrofes de um novo canto.
eu tenho um castelo de areia
mesmo à beirinha do mar
se souberes de quem lá queira
ir comigo habitar
di-lo àquela sereia
que na praia vem cantar
baladas de amor e de guerra
de poetas e gente que erra
pelas praias ao luar.

o meu castelo de areia
de conchas, búzios, madeira
e vidros e rochas do mar
tem no brasão de uma ameia
o meu coração a sangrar.

eu tenho um castelo de areia
mesmo à beirinha do mar
só não tenho quem lá queira
ir comigo habitar.
Um cigarro apagado
Uma lareira acesa
Um copo esvaziado
No tampo da mesa

Um disco que toca
Uma janela aberta
Alguém que sufoca
Na casa deserta

Lá fora o murmúrio
Das folhas ao vento
Será o augúrio
De um triste momento?

Suspenso da cama
Um laço letal
E apagada a chama
De quem foi mortal.
Eu não quero a calma, eu quero a fúria
De possuir-te nua sobre a cama
E atear em mim uma crua chama
Que arda num amplexo de luxúria.

Eu não quero lânguidas palavras
Como um beijo, sussurradas ao ouvido
Eu quero as tuas mãos das minhas escravas
O teu corpo, junto ao meu, enlouquecido.
Preciso do teu beijo, dum carinho
Do toque dos teus dedos no meu rosto
Dos lábios que tens tintos pelo vinho
Do teu perfume doce, do teu gosto.

Preciso de palavras, de conforto
De ter a tua mão entre os meus dedos
De revelar-te, enfim, os meus segredos
E de apagar em mim o ar de morto.
Deixa o velho porto a tua escuna
Num rasto de gaivotas pardacentas
E ruma para o sol que cobre a duna
De azuis e violáceos e magentas.

Eu fico à beira mar olhando a espuma
Pensando no navio que se ausenta
E sinto a tua fuga como a pluma
Cujo peso à terra firme me acorrenta.

Tu segues o caminho mais seguro
Aquele que te afasta da loucura
E só eu fico aqui, onde se apura
Um sentimento tórrido e obscuro.
Um riso furtivo
Um olhar que me amarra
Silêncios de vidro
E o meu peito dispara.

Nem beijos sofridos
Nem corpos de água
Nem nunca escondidos
Delíquios de frágua.

Apenas eu mesmo
Inseguro e imbele
Procurando a esmo
O sabor da tua pele.

Apenas um rio
Buliçoso e agreste
E em mim o frio
Do mortal cipreste.
De todos os amores foste o primeiro
Incendiário e louco, aterrador
Talvez, por isso mesmo, o verdadeiro
O único e sincero grande amor.

Amei mil outras vezes, sim, amei
Fiz juras e promessas que cumpri
Mas a primeira jura foi a ti
As outras foram cópias que inventei.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Sorriste-me da mesa do café
enquanto eu aguardava a minha bica
a voz interior dizendo "fica"
crescendo como as ondas da maré.

De novo me sorriste do balcão
tirando uma moeda da carteira
sorrindo dessa pueril maneira
que sempre me arrebata o coração.

Sorriste-me, depois, já à saída
e eu voltei ali, a procurar-te
talvez acreditando em encontrar-te
eu, que nem sorri na despedida.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Delírio (Olavo Bilac)

Nua, mas para o amor não cabe o pejo
Na minha a sua boca eu comprimia.
E, em frêmitos carnais, ela dizia:
– Mais abaixo, meu bem, quero o teu beijo!

Na inconsciência bruta do meu desejo
Fremente, a minha boca obedecia,
E os seus seios, tão rígidos mordia,
Fazendo-a arrepiar em doce arpejo.

Em suspiros de gozos infinitos
Disse-me ela, ainda quase em grito:
– Mais abaixo, meu bem! – num frenesi.

No seu ventre pousei a minha boca,
– Mais abaixo, meu bem! – disse ela, louca,
Moralistas, perdoai! Obedeci....

sexta-feira, 17 de abril de 2009

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Tango

mergulha na fragrância do meu corpo
sustenta o teu querer da minha pele
e deixa-me dançando que revele
palavras sussurradas como um sopro.

desliza, sim, desliza pela pista
com passos esvoaçantes de quimera
és tu que a luz da noite reverbera
meu palco de batalha e de conquista.